A vindima de 2013 foi complexa por varios motivos.
Complexa pela lentidão das maturações, pelas condições climaticas, mas tambem no meu caso ainda mais complexa por terem sido 7 vindimas a ter de gerir num curto espaço de tempo.
Uma vindima de branco e 6 de tintos.
Os 6 tintos provêm de 6 vinhas velhas diferentes.
Cada uma tem as suas particularidades, quer em termos de castas, de idade, de solo, de exposição solar, de altitude, etc...
Ja conhecem a vinha salva em 2010, aquela que podem a partir de agora provar no vinho engarrafado de 2011. Alem dela, este ano tratei e vindimei mais 5 vinhas pela primeira vez.
Como sabem o objectivo do projecto é identificar os "grands crus" do Dão serrano. Por isso cada vinha foi vindimada e vinificada a parte, de maneira a poder conhecê-las bem.
Caso resulte bem, estou a ponderar engarrafa-las separadamente, de maneira a que cada vinho expresse a sua vinha de origem, a boa maneira borgonhesa.
Vindimado o branco, pude virar agulhas para os tintos.
A primeira vinha a estar pronta para vindimar era a vinha centenaria.
Era a vinha com as maturações mais adiantadas, indicando ja 13% de alcool provavel.
Quinta-feira 19 de setembro de manhã, no dia a seguir a vindima do branco, pela fresca, la voltamos então a vinha centenaria para realizar a primeira vndima de tinto do ano.
Esta ja estava safa!
Nestes dias andava preocupado com as previsões meteorologicas, pois daqui a uma semana anunciavam chuva durante dias seguidos. Mas não me podia precipitar a vindimar logo o resto, pois as maturações estavam mais atrasadas, avançavam lentamente. Tinha de tentar deixa-las avançar até ao ultimo momento antes da chuva.
Era importante conseguir vindimar tudo antes das chuvas.
Pois com a carga de chuva que anunciavam, as uvas poderiam depois encherem de agua e os seus componentes ficarem mais diluidos. Poderia tambem aparecer a seguir focos de podridão.
Como se isso ja não bastasse, outro risco que tinha de ter em conta é que a chuva iria lavar as peliculas da uva, levando com ela as leveduras tão preciosas para a fermentação alcoolica. Isso não é problematico para a maior parte dos produtores, pois quase sempre utilizam leveduras de laboratorios para fermentarem o vinho.
Ora no meu caso, não utilizo essas leveduras exogenas.
Como pretendo expressar o local da vinha, fermento o vinho naturalmente, com as leveduras da propria uva, as leveduras vindas da vinha.
Ora se chove muito e as uvas ficam lavadas, fico sem parte das leveduras indigenas, correndo então o risco de a fermentação não arrancar ou de não ir até ao fim...
Conciente destes riscos tinha mesmo de conseguir vindimar tudo antes da chuva. Caso contrario seria dificil conseguir expressar os terroirs de cada vinha.
Dois dias depois, no sabado 21 de manhã, fomos vindimar a vinha velha dos clones antigos de Jaen. Vinha virada a norte, o que me parece interessante por permitir atrasar a maturação desta casta precoce. Permite tambem preservar frescura nesta casta que perde facilmente acidez se apanhada demasiado tarde.
Solos desde sempre trabalhados a mão, a enxada. Solos graniticos que nunca conheceram nem herbicidas, nem tratores. Solos por isso arrejados e cheios de vida, portanto solos aptos a expressão do terroir.
Esta foi das raras vinhas que apresentavam uma quantidade de branco abaixo de 5%.
Como tal decidi apanhar tudo junto para assim experimentar uma vinificação a moda antiga.
Faltavam então mais 4 vinhas por vindimar o tinto e as previsões ameaçavam a partir do meio da semana seguinte. Fui esperando, esperando, mas a cada dia que passava, as previões pioravam...
Segunda-feira, tive de tomar uma decisão.
Anunciavam chuva intensa durante varios dias a partir de quinta-feira.
As quatro vinhas teriam de ser vindimadas nos dois dias que restavam antes da chuva.
Por isso na segunda-feira, alem de tratar das vinificações ja em curso, foi dia de organizar as vindimas e avisar o pessoal da vindima.
Esses dois dias forem super intensos, 4 vindimas e ao mesmo tempo vinificações a seguir e mais uns quantos assuntos a resolver. Não foi facil e confesso, ao fim dos dias estava mesmo de rastos com o cansaço. Mas la conseguimos!
Começamos na terça-feira de manhã cedinho por uma vinha velha situada no cimo de um monte, perto da centenaria. Vinha praticamente abandonada, em estado em que pouco falta para de qualificar de selvagem.
Vinha num sitio como ha poucos, solos pobres, onde tem mandado a natureza, esposição exepcional com um poente fantastico no cimo deste monte. Vinha cuja idade se desconhece precisamente, mas desde que ha memoria sempre ali houve aquela vinha.
Vinha mal tratada nos ultimos anos e em que terei agora a responsabilidade e o privilégio de mimar!
Depois da tradicional "buxa", a vindima prosseguiu noutra vinha que recuperei este ano e de que ja vos tinha falado no ultimo inverno.
Vinha que iria ficar por podar ja este ano se não lhe pegava. Vinha portanto que tinha a morte prometida.
O solo desta encosta é muito pedragoso e cheio de nuances, com partes com bocados de granito grandes e outras com granitos mais finos e cor de rosa.
No ultimo inverno, quando descobri a vinha e provei o vinho caseiro do dono, em garrafão, tinha ficado espantado pelo caracter do vinho, onde a mineralidade profunda sobressaia entra a fruta vermelha fresca.
No ciclo que agora terminou, não deu para realizar grandes trabalhos de recuperação, pois descobria ja em inicio de março. So deu para a podar e realizar os tratamentos, basicamente. Foi podada deixando geralmente apenas 3 a 4 olhos, pois a vinha notava-se que estava fraquinha em termos de vigor. Este ano tera de ser bem trabalhada. Trabalhar os solos com o cavalo e estrumar, a ver se ganha uma nova juventude.
Com o avançar do ciclo vegetativo deu para ir percebendo as castas presentes. Nas tintas, tive a surpresa e o prazer de descobrir que a casta mais presente era o Bastardo!
Essa casta, que a par do Jaen, deixa os velhotes do sopé da Serra da Estrela, com os olhos a brilhar quando falam dela!
Apesar de ser uma casta precoce, este ano, tal como as outras custou bastante a amadurecer.
Por isso foi mais um vinho com 12,5% de alcool provavel que se vindimou.
Da parte da tarde, subimos a Serra, para ir vindimar a vinha centenaria que tambem estou a começar a recuperar ja a 600m em altitude, em plena encosta da Serra.
Mais uma vinha que nunca conheceu nem tractor, nem herbicida.
Mais uma vinha em que deposito grandes expectativas!
Terminada a terceira e ultima vindima do dia, ja no fim da tarde, voltamos para a adega.
Faltava ainda muito trabalho para acabar o dia.
3 vindimas para desengaçar e encubar nas dornas.
O dia ja so acabaria com a noite adiantada.
No dia a seguir chegava a ultima das vindimas do ano, o da vinha que salvei em 2010 e cujo vinho de 2011 esta ja engarrafado e a venda.
A primeira que tratei e a maior de todas com os seu ha.
Vinha que esteve a beira da morte depois de 3 anos sem ser podada. Hoje em dia com todo o carinho e todos os miminhos que levou desde 2010, esta lindissima, como provavelmente nunca esteve.
A geada de fim de abril tinha afectado fortemente esta vinha. No final deu para perceber que se perdeu com a geada mais ou menos 50% da produção do ano. Mesmo assim não me posso queixar muito, pois na altura cheguei a temer ter perdido 90% da produção...
Assim sendo consegui ainda uns 1700 L deste ha de vinha.
Assim terminou a vindima de 2013.
No dia seguinte, as previsões confirmaram-se com a chuva a iniciar. Seguiu-se então um diluvio de uma semana. Ja com tudo na adega, pude me considerar feliz!