sábado, 27 de dezembro de 2014

O peso historico da Baga no Dão

Hoje em dia quando falamos do Dão, poucos associam a casta Baga a esta região.
No imaginario colectivo a Baga esta muito mais associada a Bairrada.

Neste blog tenho explicado que nas vinhas velhas do Dão Serrano a Baga forma a par da Jaen e da Tinta Amarela a base do encepamento. Ou seja, estas vinhas testemunham da presença massiva da Baga na região de outrora.

No post de hoje, partilho convosco o seguinte quadro, baseado num estudo encontrado na net. Estudo realizado por 3 cientificos portugueses sobre a evolução do encepamento da região demarcada do Dão (LC Carneiro, Antero Martins e Vanda Pedroso).


Este quadro baseia-se nos dados do Cadastro Viticola dos concelhos da região demarcada do Dão, publicados no inicio dos anos 80 (entre 1983 e 1985). Mostra as duas castas tintas mais presentes no encepamento de cada um destes concelhos na altura, assim como a % do encepamento.

Baga do concelho de Seia
Vemos que a Baga estava no inicio dos anos 80 nas duas castas tintas mais plantadas em cada concelho do Dão (salvo Fornos de Algodres). Associada geralmente com Jaen ou Tinta Amarela, por vezes tambem com Tinta Pinheira, Negro Mouro ou Tinta Carvalha.

As percentagens da Baga e da segunda casta representava 45 a 95% do encepamento.

A Baga era portanto a grande casta do Dão.

Hoje em dia a Baga desapareceu das plantações, sobrevive nas poucas vinhas velhas que restam.

Tal como a Tinta Pinheira, a Negro-Mouro ou a Tinta Carvalha, é hoje mal amada pelos produtores da região.

Preferem focarem-se nas pseudos castas ditas "nobres", por exemplo na estrangeira Tinta Roriz, casta mal adaptada as caracteristicas climaticas da região.

Chega a dar a sensação que os produtores do Dão têm vergonha do passado da região, das suas raizes historicas.


Ora como ja perceberam, este blog e este projecto vitivinicola é exactamente o contrario.
E um projecto que tem orgulho no Dão, na sua historia e que procura valorizar o que resta do seu patrimonio historico, antes que caia definitivamente no esquecimento...

Finds of the year

O meu Dão 2011 foi considerado pela critica britanica Sarah Ahmed como uma das suas descobertas do ano de 2014!

E para este projecto uma grande noticia que partilho convosco aqui :
http://thewinedetective.co.uk/blog/australia/2014-review-surprises-sublime

"Niepoort have also made incursions into the Dão, in Serra d’Estrela where another of my “finds of the year,” Antonio Madeira, is similarly focused on old vines/restrained, terroir-translucent wines.  I hope Madeira is able to realise his dream to make wine full-time – he is a talented self-taught winemaker and engineer like Alvaro Castro, in whose cellars he makes his wine and who himself has a very exciting new old vine small parcel (1 barrel!) project.  (Incidentally, I came across Madeira and Castro’s old vine wines at Simplesmente Vinho, an Oporto wine fair for small, artisanal producers open to the public.  Well worth a visit).  "
Sarah Ahmed, The Wine Detective, 24/12/2014

sábado, 20 de dezembro de 2014

As castas brancas nas vinhas velhas do Dão Serrano

O post de hoje serve para partilhar convosco o resultado do trabalho de cadastro das vinhas velhas que cultivo no Dão, no sopé da Serra da Estrela.
E interessante perceber a composição das vinhas em termos de castas, pessoalmente retiro ensinamentos.

Focamos hoje nas castas brancas.
Brancas que andam nas vinhas misturadas com as castas tintas.

De ha dois anos para ca tenho as vindimado a parte, vamos por isso poder provar o resultado nos vinhos brancos de 2013 e 2014.

Então, segundo o cadastro viticola tenho la estas castas brancas:


O primeiro ensinamento é que o field blend é dominado por duas castas brancas, a Siria e a Fernão Pires. Juntas constituem 60% das cêpas brancas presentes nestas vinhas velhas do Dão Serrano.

Siria
A Siria é a casta mais presente, cerca de 35% do encepamento branco.

Trata-se de uma casta muito antiga na região, como testemunha esta cêpa centenaria.

No Dão tambem é conhecida pelo nome de Alvadurão.

Esta casta esta presente de norte a sul do pais, sempre no interior. No Alentejo é conhecida por Roupeiro, no Douro por Codega. E na Beira Interior que se tem ouvido mais falar dela nos ultimos anos. 

A Siria, tal como algumas outras tintas, é uma casta que se encontra dos dois lados da Serra da Estrela, quer na Beira Interior, quer nas vinhas velhas do Dão Serrano. 








Fernão Pires

A seguir a Siria, vem a Fernão Pires. 

Casta bastante conhecida no litoral, em particular na Bairrada, tambem sob o nome de Maria Gomes. 

A Fernão Pires era uma das castas preferidas dos pequenos lavradores do Dão Serrano, como testemunham estes 25% do encepamento branco.

Cada vez que falei com os velhotes da aldeia sobre castas brancas, a Fernão Pires era sempre mencionada com carinho.

E uma casta que amadurece bem e que traz bastante sabor ao mosto.









Borrado das Moscas

Em terceira posição aparece a Bical com 14%.

A Bical tambem é das favoritas dos lavradores do Dão Serrano.

Localmente não é por este nome que a conhecem.
Utilizam sim o nome bem beirão de "Borrado das Moscas", nome que se refere as pequenas pintas castanhas presentes na pelicula dos bagos.

Pessoalmente é uma das minhas castas preferidas, pois gosto muito dos vinhos onde entra que provei quer no Dão, quer na Bairrada.

Com estas três castas, Siria, Fernão Pires e Bical obtemos 74% do lote.








Dona Branca
A seguir com os seus respeitaveis 8% aparece uma curiosidade, a Dona Branca.

Trata-se de uma casta que pessoalmente não conhecia.

Na net encontramos informação que indica de que se trata de uma casta vinda de de terras de nuestros hermanos.
Pois em Espanha em regiões fronteiriças com Portugal, nomeadamente na Galicia e em Castilla y Leon existe uma casta chamada Doña Blanca.

Uma casta ibérica, cuja presença no Dão talvez resulte de intercambios historicos, transfronteiriços. Afinal o vinho é mesmo isso resultado de movimentos de intercambio ao longo dos anos, dos séculos, entre regiões ou mesmo paises.









Arinto
Em quinta posição encontramos outra casta mais conhecida noutras regiões, sendo Bucelas o local onde atingiu mais fama. Estamos a falar do Arinto.

E se existe uma casta chamada Arinto do Dão, neste caso estamos mesmo a falar do Arinto de Bucelas.

Nas vinhas velhas que cultivo representa 5% do encepamento branco. 
Reconhece-se facilmente nas vinhas pelo seu cacho bastante apertado, de bagos pequenos, geralmente verdes, acastanhando na altura da maturação.

E uma casta que contrbui ao blend com a sua acidez natural elevada.






Para finalizar o field blend, encontramos 13% de castas diversas. 

Encruzado

Muitas castas diferentes, em quantidades residuais, apenas algumas cêpas.

Nestas "diversas" encontramos por exemplo o famoso Encruzado, aqui com apenas uma dezena de cêpas.

Uma casta que poderia ter desaparecido sem a aposta que tem vindo a ser feita na região ha duas décadas para ca.

Encontramos tambem de forma residual, a Malvasia-Fina ou a Rabo de Ovelha, entre outras.













E assim termina o texto de hoje. Nos proximos tempos publicarei um post similar, desta vez sobre as castas tintas presentes nestas vinhas.

Despeço-me com um voto de Feliz Natal para todos vos!

domingo, 14 de dezembro de 2014

A replantação das falhas nas vinhas velhas

Duas das vinhas velhas que cultivo apresentam um numero importante de falhas. Vinhas com cerca de 90/100 anos.
Falhas que resultaram da morte de cêpas que não resistiram ao tempo e ao trato.
Nestes dois casos, a proporção das falhas é bastante elevada, tornando a exploração desta duas vinhas quase irracional.
E em anos maus como 2014 em termos de quantidade, manter estas vinhas torna-se quase num acto heroico, pois cada uma destas duas mal deu para uma barrica.
Das duas uma... Ou abandono estas vinhas ou tento replantar as falhas (sendo que mesmo replantadas, a quantidade mantera-se bastante baixa).

Falhas na vinha da Serra
Decidi lançar-me no projecto de replantar as falhas.
Mas não quero fazê-lo mal, quero respeitar o caracter do local, o caracter de cada vinha. Não quero alterar o caracter do vinho resultante de cada uma destas duas parcelas.
Por isso não quero plantar bacelos enxertados, comprados no comercio.
Não vou plantar Tourigas, nem outro material pronto a plantar.


Como disse quero respeitar o caracter de cada vinha e por isso, na minha opinião, isso so sera possivel plantando material vegetativo proveniente da propria vinha.
Isso implica perder um ano em relação a solução de facilidade que seria de plantar bacelos enxertados do comercio.

Vou ter de plantar na proxima primavera bacelos para no ano a seguir enxerta-los no proprio local com varas selecionadas na propria vinha.

Falhas na vinha do Monte Selvagem
Tenho por isso andado a pesquizar sobre quê bacelos escolher para plantar nestas condições (solo granitico do Dão Serrano, solo muito pobre e onde ja existe vinhas antigas com raizes fundas a dificultar a plantação de plantas novas). Os bacelos têm de apresentat alguma versatilidade, dado a quantidade de castas diferentes de que serão o suporte.


As varas que servirão a replantação serão escolhidas no proximo verão. Estou a refletir sobre quais os critérios a ter em conta para a seleção. Estou a me orientar para a seleção apenas de varas tintas de maneira a poder chegar a um minimo de produção de tinto em cada vinha.
Penso escolher varas de castas antigas menos usuais, escolher principalmente varas das plantas mais residuais, para aquelas que estão mais em perigo de extinção.


A nivel de viticultura este projecto sera a principal novidade do ano. Quase que deveria escrever ano(s) ao plural pois estas coisas como perceberam não se fazem em um ano.

Vai-me dar gozo realizar este novo projecto!