Aproveitei a semana passada no sopé da Serra da Estrela em finais de Fevereiro para continuar a pesquizar e identificar parcelas de vinha com potencial.
Num desses dias voltei a pesquizar uma zona que aprecio particularmente e onde se encontram varias vinhas muito interessantes, principalmente pela qualidade do local.
Encarrei assim com uma vinha ainda por podar, no meio de varias parcelas ja podadas. Naquela altura do ano, a poda ou ja foi feita ou esta a acabar. Gostei do sitio, do solo em particular, muito mineral e com desnivel. Alem disso a exposição tem um poente bom.
Voltei la uns dias mais tarde e a vinha continuava por podar... Estranho!
Era fim de tarde, o sol ja estava baixo e reparo que pessoal estava a acabar de podar uma vinha mais abaixo. Vou ter com eles. Pergunto se sabem a quem pertence a vinha.
Explicam-me que o dono ja não a vai podar mais, que a vai deixar morrer...
Indicam-me o nome e a morada do dono, para ir falar com ele. La vou eu.
Chego a povoação la encontro a casa e o dono, uma pessoa ja com uns 60 e tal anos.
Apresento-me, explico-lhe que vi a vinha dele e pergunto-lhe porque ja não a quer podar mais.
Responde-me que bem gostaria, mas que teve um problema de saude que ja não lhe o permite. Alem disso, os filhos ja não vivem na região, não tem ninguem para pegar na vinha.
Pergunto-lhe se não esta interessado em arrendar a vinha e responde-me que não. Fico surpreendido e pergunto-lhe "porquê?"
"Sabe, dediquei-me muito a esta vinha, não imagina o trabalho que tive nela. Em tempo, cheguei a ir buscar estrume de proposito ao Sabugueiro...", "Prefiro deixa-la morrer, do que vê-la mal tratada por outra pessoa", "se reparou bem eu so deixo 3, 4 olhos nas videiras, não lhes deixo carga a mais".
Enquanto o homem me apresentava os seus argumentos, percebo que estou perante alguem que sabia do que estava a falar, sabio e apaixonado.
"Claro, vamos a isso".
Descemos a loja.
Os copos são os habituais copos de tasco, não são bem apropriados a prova, mas bom, se não permitem analisar os aromas, sempre permitem beber.
O homem abre dois garrafões, um de branco e outro de tinto, vira-se para mim e diz-me "agora é que vais ver o que é vinho!"
O homem abre dois garrafões, um de branco e outro de tinto, vira-se para mim e diz-me "agora é que vais ver o que é vinho!"
Serve primeiro o branco. Provo, sente-se o gas, deve ter engarrafado sem que a malolactica tenha terminado. Não da muito para ter uma opinião definitiva.
Depois serve-me o tinto. Pego no copo, levo ao nariz, apesar do formato do copo, parece-me estar ali algo de interessante.
Depois, levo o vinho a boca e ai passa-se algo fora do normal!
Depois, levo o vinho a boca e ai passa-se algo fora do normal!
O vinho esta limpissimo, sem alterações, puro, concentrado, tenso, com uma frescura terrivel. Um equilibrio impressionante!
Em termos de sabores, encontro uma mineralidade incrivel envolvida numa manta de fruta vermelha densa e fresca. Recordo-me que naquele momento veio a cabeça a imagem de pedras a rolarem num ribeiro, era mesmo essa a sensação que tinha na boca! Tipo ondas de pedras a rolarem num ribeiro de fruta. Sensações destas são mesmo raras, so mesmo em grandes vinhos. Fantastico!
Viro-me para o homem e "digo-lhe gosto mesmo disto, tem razão, isto sim é vinho!", "é mesmo uma pena você deixar morrer a vinha".
Continuamos a falar e chegamos a um acordo que agrada a ambos. Experimento este ano, podo a vinha, trato dela, se no fim do ano o senhor gostar da minha maneira de trabalhar, continuo nos outros anos, se não gostar, saio.
E
E agora a terceira vinha de que trato.
Em termos logisticos (e não so) começa a tornar-se complicado...
Mas se não experimentasse esta vinha, penso que ficaria sempre com remorsos.
A aventura vai assim crescendo passo a passo.
A esse comportamento é que se chama coragem pelo que se faz e paixão pela terra que tudo nos dá desde que bem tratada.Parabéns.
ResponderEliminarAntónio começa a ser surreal ler o teu blog, as historias fazem-me lembrar um filme qualquer onde o vinho é mito e lenda e envolvem-se numa viagem fantastica pelos nossos pensamentos...qual vinho de garagem!!!
ResponderEliminar